domingo, 17 de julho de 2011

Conto: Sophia e o Amor Infernal

Aos poucos o blog volta a respirar. Aos poucos, o Marco Vs. Blogspot volta a caminhar. Lentamente, mas com muita força de vontade. O blogspot pode ter parado, mas o Marco não parou; ainda escrevi meus contos, minhas músicas, meu livro... ficou parado na mesma página que anunciei no primeiro post desse blog.
Sem mais nhé nhé nhé, sem mais mimimi, lhes apresento o conto que escrevi pro Escribas (blog de uns bons escritores iniciantes de Paulínia, o qual logicamente eu participo, com contos feitos através de temas... deem uma olhada.)
Boa leitura, e levantem vossas calças.

Ninguém para uma garota que sabe o que quer, e com Sophia a regra não poderia ser diferente.
 O reino de Quinospera era só um reino como todos os outros, nada de especial. Neste reino se localizava o pequeno feudo de Aldebran, que também era mais um feudo sem nada de especial:
suas terras eram férteis, seus campos eram altos e floridos, as árvores tortuosas preenchiam os bosques negros com um toque ainda mais sombrio. O catolicismo predominava fortemente entre os habitantes de Quinospera, todos eram devotos totalmente fiéis. Todos os devotos acreditavam na fé e em milagres. Todos os habitantes eram assim, com exceção apenas de uma adolescente chamada Sophia Ketrey.
  Rachel, era a mãe de Sophia e ia às catedrais todos os dias para rezar pelo seu marido, que havia sido chamado para participar das temidas Cruzadas, as batalhas sangrentas que aterrorizavam até mesmo o guerreiro mais forte e confiante do reino. Força, habilidade e sorte eram atributos mais do que necessários nas batalhas, mas Rachel tinha certeza de que suas orações ajudariam o marido à decepar alguns membros dos inimigos. Sophia era um pouco rebelde e acompanhava sua mãe nas rezas não porque estava interessada no sucesso do seu pai nas batalhas, muito menos no arcebispo falando sem parar. A bela jovem loira, com seus cabelos que cobriam delicadamente parte de seu rosto, sua pele sedosa e sua personalidade forte, Sophia destacava-se de todas as outras garotas e mulheres de Aldebran, não só pelos seus atributos, mas sim pelo seu estranho e secreto desejo: conhecer o Diabo.
  Por ser uma catedral grande e muito famosa, muitos fiéis buscavam ajuda para possessões demoníacas ali. Era disso que Sophia gostava. Toda semana ao menos um ritual de “exorcismo” era executado. Sophia vibrava por dentro ao ouvir aquela voz grave e distorcida, aquele cheiro de enxofre preenchendo seus pulmões. Ela não só queria conhecer o Diabo, como também já havia pego uma certa simpatia por ele: lendo seus livros religiosos, Sophia descobriu que Lúcifer havia sido expulso do Paraíso por não gostar dos humanos, e ela achou isso ótimo – pois também não gostava deles.
  “Guerras feitas por causas inúteis, egoismo, prostituição e tudo mais. Ele está certo em não gostar dessa raça imunda!” – Pensava a garota consigo mesma.
  Ela tinha certo receio por causa dessa descoberta, pois pensou um pouco e lembrou que ela era uma humana. Ela pertencia a esta raça imunda. Ela parecia não ter chance alguma com o anjo caído, mas quis tentar mesmo assim.
  A missa de domingo sempre era a mais lotada e também a que guardava mais surpresas, e Sophia pensou em se aproveitar de umas dessas surpresas, já tendo um plano em mente: invocar o Senhor das Trevas para uma conversa particular.
  O padre deu então início a missa. Os feixes de luz atravessavam o belo e imenso vitral localizado logo acima do altar, iluminando os olhos já brilhantes de todos os devotos presentes. Como um ataque súbito, Sophia se levantou, saiu de perto da sua mãe e seguiu para o altar, fazendo todos aqueles olhos brilhantes se voltarem para ela. O padre parou e fitou-a com um olhar de autoridade. Sophia simplesmente ignorou-o, e começou a vociferar palavras em latim, as quais provavelmente havia aprendido lendo os livros antigos que ela tanto adorava. Aquele olhar idoso, cansado e assustado, aos poucos foi dando lugar ao olhar pesado, atormentador, obscuro e demoníaco. Aquele não era mais o padre, aquele era Lúcifer – ou ao menos a sua alma vestida com alguns trapos.
  Sophia se ajoelhou e chorou como uma criança. Teve medo, mas sentiu algo ficar mais forte dentro dela. Seu coração palpitava, se debatia, chamava alguém. A garota dos cabelos dourados percebeu que Lúcifer se aproximava lentamente, ignorando todos os gritos e tentativas de exorcismo que vinham da Plateia da Fé. O coração de Sophia chacoalhava mais forte do que antes, mas aos poucos ela foi entendendo o que se passava. Bastou só um sussurro do demônio em seus ouvidos, e Sophia já sabia o que sentia, já sabia o que fazer. Se pôs de pé, abraçou sua invocação e em seguida se pôs de frente ao público desesperado que ainda permanecia na catedral. Pensou um instante; pensou no seu pai batalhando nas Cruzadas; pensou na sua mãe, sempre preocupada demais; pensou naquele mundo cheio de injustiça, dor e sofrimento. Seu pensamento então deu lugar à palavras em latim, e mais uma vez o seu feitiço começou a surtir efeito.
  A catedral então ardeu em chamas, devastando todos que estavam lá dentro. Gritos, berros, estalos. Churrasco. Sophia sorria, sorria como nunca havia sorrido antes. Lúcifer sorriu também, e com motivo: a garota havia condenado muitas almas, logo mais escravos espirituais apareceriam no Inferno. Sim, é claro que ela sabia o que tinha feito, mas ela fez o que fez por amor. Sophia se apaixonou por Lúcifer, e teve certeza disso a partir do momento em que seus olhos se encontraram. Humanos as vezes são sujos, imprevisíveis e assustadores. Humanos apaixonados são piores ainda. Ninguém parou Sophia; e nem poderia. Ninguém para uma garota que sabe o que quer, e com Sophia não foi diferente. Ela queria um amor eterno... e conseguiu. Ela conquistou o seu amor infernal e surreal, mesmo isso lhe custando a sua alma e a de muitos outros que ali estavam presentes.
  Vitoriosos, os guerreiros de Aldebran retornavam da Cruzada. O grupo da frente estava sendo liderado pelo pai de Sophia. Os gritos e brados de vitória se transformaram em urros abafados de desespero quando os guerreiros se deram conta de que, lá no horizonte, o feudo inteiro estava sendo consumido por um enorme incêndio. Atravessaram mais que depressa os bosques escuros, mas de nada adiantaria a pressa. Não havia mais nada que pudesse ser salvo em Aldebran.
  O fogo na catedral queimou um pouco mais, e o mais novo casal das Profundezas dançava uma valsa, enquanto tudo se perdia em cinzas.

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